Portugueses,
Ouvidos os especialistas, com o parecer favorável do Governo e a autorização amplamente consensual da Assembleia da República, acabo de renovar, até ao dia 17, o estado de emergência.
E, porque esta é uma causa nacional, uma vez mais estivemos todos os órgãos de soberania unidos e solidários.
Como unidos e solidários têm estado, exemplarmente, os portugueses nas suas casas, no trabalho, na coragem serena a enfrentar a pandemia.
Sabendo que este é, vai ser, porventura o nosso maior desafio dos últimos quarenta e cinco anos.
Porque nos ultrapassa na sua origem e no seu fim. É universal e o adversário é insidioso e imprevisível.
Porque atinge, concentradamente, vida e saúde, sem paralelo na nossa história democrática.
Porque os seus efeitos económicos e sociais serão mais profundos e mais duradouros do que as crises mais longas que já vivemos.
Porque agrava brutalmente a pobreza dos mais pobres, as desigualdades dos mais desiguais, as exclusões dos mais excluídos.
Porque vai exigir reforçada atenção e punição daqueles que queiram aproveitar-se da crise para atividades criminosas contra os valores da Constituição que votámos faz hoje precisamente quarenta e quatro anos.
Os portugueses perceberam tudo isto e decidiram abraçar a luta comum. Profissionais da saúde continuam a fazer milagres.
Forças Armadas e de Segurança, Bombeiros e Proteção Civil, não descansam.
IPSS e Misericórdias e voluntários desmultiplicam-se.
Empresas alteram planos para produzir o que mais nos falta.
Cientistas trabalham em novos testes, fármacos e vacinas em grupos internacionais.
Professores mudam métodos de ensino.
Agricultores iniciam sementeiras e plantações de alimentos essenciais para o nosso dia a dia.
Operários produzem para a exportação possível.
Camionistas mantêm fornecimentos quase inviáveis.
Hoteleiros alojam desalojados de lares ou médicos e enfermeiros isolados das famílias.
Comerciantes de estabelecimentos encerrados apoiam obras sociais.
Autarcas e pessoal autárquico palmilham freguesias e municípios.
Todos entendem que o caminho é muito longo e muito exigente.
Começa no combate da vida e da saúde, sem o qual o combate da economia e da sociedade não pode ser travado com sucesso.
Mas a vida e a saúde exigem que a economia e a sociedade não parem.
Dentro do combate da saúde há, desde logo, quatro fases.
A primeira fase foi a das últimas semanas – evitando que o crescimento do número de contaminados atingisse níveis excecionalmente elevados e o recurso generalizado ao internamento de milhares de doentes, entre o final de março e o início de abril, provocasse a rutura do sistema, sem tempo para ajustar estruturas, reforçar meios, enfrentar uma subida descontrolada da pandemia.
A segunda, em que entramos, será a das próximas semanas, neste mês crucial de abril, tentando manter a desaceleração do surto, consolidando a contenção, tratando a maioria esmagadora dos infetados em casa, e gerindo a subida de doentes carecidos de internamento e, sobretudo, de cuidados intensivos.
A terceira será a vivida nas semanas seguintes, mais cedo ou mais tarde consoante o sucesso da segunda, invertendo definitivamente a tendência do crescimento de casos, mas ainda enfrentando números exigentes em internamento grave e crítico. E abrindo para a descompressão possível na sociedade portuguesa.
A quarta – controlando, de forma consistente, o surto, mesmo se ainda assistindo à parte final dos custos humanos da pandemia. Uma fase de progressiva estabilização da nossa vida coletiva.
Para já ganhámos a primeira batalha, a da primeira fase, adiámos o pico e moderámos a progressão do vírus.
Onde o número de infetados certificados começara a subir a mais de 30% e até a mais de 40% por dia, conseguimos baixar para valores de crescimento de 15% a 20% e, depois, nos últimos dias, inferiores a 15%, como ontem e hoje.
Ganhámos tempo, com as medidas restritivas e, sobretudo, com a notável adesão voluntária dos portugueses. Ganhámos tempo para o traçado das primeiras e mais urgentes medidas económicas e sociais.
Agora, temos de ganhar a segunda fase – não podemos desbaratar a contenção da primeira, temos de consolidar a moderação do surto com números que vão subir ainda, e muito, em valores absolutos, mas que irão, esperamos, descer em percentagem de crescimento e ao mesmo tempo a pôr de pé, no terreno, os apoios sociais e económicos mais urgentes de entre os urgentes.
E temos, nesta segunda fase, de nos focar em cinco objetivos fundamentais:
Primeiro – proteger reforçadamente os grupos de maior risco, onde quer que vivam, ou se encontrem, em suas casas, em nossas casas, nos lares, em residências sociais ou, na rua, sem teto e sem abrigo.
Desta frente pode depender, decisivamente, o sucesso da segunda fase e o passarmos mais depressa à terceira.
Dos estudantes aos trabalhadores em lay-off, às Forças Armadas, às forças de segurança e aos bombeiros – tudo o que é possível tem sido e deve continuar a ser mobilizado, por Governo e autarcas, para essa frente.
Segundo – utilizar, com bom senso e rigoroso critério, a abertura da renovação do estado de emergência para prevenir situações críticas de saúde pública nos estabelecimentos prisionais, em particular na população de maior risco ou de maior vulnerabilidade.
Governo, Assembleia da República, e poder judicial terão uma palavra a dizer, à qual o Presidente da República juntará a sua, exercendo o poder constitucional de indulto em casos concretos.
Terceiro – assegurar que, por muitas razões que haja – e há – para cansaço, ansiedade, lassidão, nesta Páscoa, não troquemos uns anos na vida e na saúde de todos, por uns dias de férias ou reencontro familiar alargado de alguns.
Daí as medidas extraordinárias do Governo, medidas a que o estado de emergência dá força acrescida, limitando a circulação de pessoas, de fora, para fora e cá dentro na época pascal.
Quarto – pedir aos nossos compatriotas, que, de fora, quiserem vir, que entendam as restrições severas que cá dentro adotaremos para a Páscoa e repensem, adiando os seus planos, como todos nós estamos a adiar os nossos planos, a pensar na Pátria comum.
Quinto e último objetivo – definir os cenários para o ano letivo, atendendo à evolução da pandemia em abril. Mais uma das opções do Governo, na sua exigente missão nacional, que o Senhor Primeiro-Ministro comunicará ao País no dia 9.
Este é o nosso principal caderno de encargos para os próximos quinze dias.
A renovação do estado de emergência, amanhã iniciado, neste mês essencial de abril, – um estado de emergência preventivo que hoje praticamente todos compreendem bem por que tinha de ser declarado quando foi –, tem como fim ajudar-nos a cumprir este caderno de encargos e a ganhar a segunda fase do combate pela vida e pela saúde, assim abreviando o começo da reconstrução económica e social de Portugal.
Mas só ganharemos Abril, se não facilitarmos, se não condescendermos, se não baixarmos a guarda.
Outras experiências mostraram que situações do grupo de risco e visitas à terra e à família custaram explosões entre os trinta e os cinquenta dias de epidemia.
Sejamos verdadeiros.
Vai custar a ver os números de infetados atingir as duas ou três dezenas de milhares até ao dia 17? Vai. Mas o que importa é sabermos que o número de testes está a aumentar – e bem – e que isso significa detetar mais infetados, que a maioria deles não é grave, e, sobretudo, que o que vai fazer a diferença é a percentagem de crescimento diário.
Uma percentagem a descer é o surto a quebrar e a aproximar-se a viragem irreversível.
Tem sido e continuará a ser uma mudança radical na nossa vida? Tem sido e terá de ser por mais umas semanas. Mas o que importa é sabermos que essa mudança pode valer muitas dezenas de milhares de vidas salvas.
Que seja para os que sofreram ou ainda sofrem com a pandemia e para aqueles que nela morreram, sós e sem despedida, e para suas famílias, a nossa última evocação solidária.
Nós não os esquecemos.
E é por eles e pelos milhões e milhões que somos que nos comprometemos a vencer esta segunda fase, assim permitindo vencer o maior desafio da vida de todos nós.