Muito boa noite,
Portugal é onde se encontre um português. Nas nossas fronteiras físicas ou, por todo o mundo, nas nossas fronteiras espirituais. Aí vivendo ou servindo em missão nacional.
A todos saúdo e agradeço os Portugais novos que criam dia após dia.
Estranho e contraditório ano esse, que ontem terminou, e que exigiu tudo de todos nós.
Estranho e contraditório ano no mundo, com tão veementes proclamações de paz e de abertura económica, e tão preocupantes ameaças de tensão e protecionismo, pondo à prova a paciência e a sensatez de muitos, e, em particular, do Secretário-geral António Guterres.
Estranho e contraditório ano na Europa, com tão claro crescimento e desejo de recuperação do tempo perdido e tão lenta capacidade de resposta e de reencontro com os europeus.
Estranho e contraditório ano, também em Portugal.
Ano povoado de reconfortantes alegrias, mas também de profundas tristezas.
Começou ele com a partida de um dos maiores da nossa Democracia, Mário Soares, reunindo, nesse momento de respeito, tantos de tantas famílias políticas e sociais.
Ao invés, em maio, testemunhou como vibrámos, crentes e não crentes, com uma chegada histórica – a do Papa Francisco, o apóstolo dos deserdados desta era.
Entretanto, íamos vivendo, finanças públicas a estabilizar, banca a consolidar, economia e emprego a crescer, juros e depois dívida pública a reduzir, Europa a declarar o fim do défice excessivo e a confiar ao nosso Ministro das Finanças liderança no Eurogrupo, mercados a atestarem os nossos merecimentos. Tudo isto colocando fasquias mais altas no combate à pobreza, às desigualdades, ao acesso e ao funcionamento dos sistemas sociais e aconselhando prudência no futuro. Mas permitindo a Portugal apresentar como exemplo a determinação dos portugueses.
Ninguém imaginaria, há menos de dois anos, poder partilhar tão rápida e convincente mudança. Sem dúvida iniciada no ciclo político anterior, mas confirmada e acentuada neste, que tão grandes apreensões e desconfianças havia suscitado, cá dentro e lá fora.
E nem faltariam ao crescendo de alegrias de boa parte do ano que findou, o triunfo europeu da nossa música, os excecionais galardões no turismo, o sucesso reiterado no digital, os êxitos nas artes, na ciência, no desporto, colocando Portugal como um destino cimeiro.
Se o ano tivesse terminado em 16 de junho, ou tivesse sido por mais seis meses exatamente como até então, poderíamos falar de uma experiência singular, constituída quase apenas por vitórias.
Assim não foi, porém. Um outro ano, bem diverso, se somou ao primeiro, a partir 17 de junho, dominou o Verão e adensou-se em 15 e 16 de outubro, marcado pela perplexidade em Tancos, o pesar no Funchal, o espectro da seca e, sobretudo, as tragédias dos incêndios, esse pesadelo para todos nós, tão brutalmente inesperadas e tão devastadoras em perdas humanas e comunitárias que acabariam por largamente pesar no balanço de 2017.
Tudo pondo à prova o melhor das portuguesas e dos portugueses – a resistência, o afeto, a iniciativa, a fraternidade militante, que levou ainda mais longe a nossa tradicional solidariedade.
Hoje, dia 1 de janeiro, é do futuro, porém, que importa falar.
O passado – bem recente – serve para apelar a que, naquilo que falhou em 2017, se demonstre o mesmo empenho revelado naquilo que nele conheceu êxito. Exigindo a coragem de reinventarmos o futuro.
O ano que hoje começa tem de ser, portanto, o ano dessa reinvenção.
Reinvenção que é mais do que mera reconstrução material e espiritual, aliás, logo iniciada pelas mãos de muitos – vítimas, Governo, autarquias locais, instituições sociais e privadas e anónimos portugueses.
Reinvenção pela redescoberta desse, ou talvez mesmo desses vários Portugais, esquecidos, porque distantes, dos que, habitualmente, decidem, pelo voto, os destinos de todos.
Reinvenção da confiança dos portugueses na sua segurança, que é mais do que estabilidade governativa, finanças sãs, emprego crescente, rendimentos. É ter a certeza de que, nos momentos críticos, as missões essenciais do Estado não falham nem se isentam de responsabilidades.
Reinvenção com verdade, humildade, imaginação e consistência.
A mensagem que ouvi, sem exceção, meses a fio, e, novamente, na época de Natal, época de vivência familiar, feita este ano de dor pela saudade, e, por igual, de ilimitada esperança, foi uma só:
- Temos de converter as tragédias que vivemos em razão mobilizadora de mudança, para que não subsistam como recordação de irrecuperável fracasso.
- Temos de afirmar neste exigente combate coletivo a mesma vontade de vencer que nos fez recusar a resignação de uma economia e de uma sociedade condenadas ao atraso e à estagnação.
- Temos de superar o que de menor nos divide para afirmar o que de maior nos une.
- Temos de ser como fomos sempre ao longo da nossa história, nos instantes cruciais das grandes aventuras, dos grandes riscos, das grandes catástrofes, dos grandes encontros com essa História.
Esta é a palavra de ordem que vem do Povo, deste Povo, do mais sofrido, do mais sacrificado, do mais abnegado.
Vem do que ele pensa, do que ele sente, do que ele faz.
É, por isso, que, mais do que nunca, acredito nos portugueses, que o mesmo é dizer, acredito em Portugal.
Um feliz ano de 2018 para todos nós!